Bioinsumos para controle biológico de insetos-praga da cana-de-açúcar
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A cultura da cana-de-açúcar é de grande importância para a economia brasileira e tem se expandido em diferentes regiões do país. Isso diminui as barreiras naturais como a vegetação nativa, permitindo o aparecimento ou aumento de diferentes insetos-praga. O ideal é que se faça o manejo integrado proporcionalmente. E o controle biológico é um dos métodos que fazem parte desse manejo integrado. Ele consiste no controle de pragas por meio de inimigos naturais, que podemos chamar de bioinsumos, para manter os níveis de população prejudicial em equilíbrio, sem dar prejuízos econômicos ao produtor.
Felizmente, a cultura da cana-de-açúcar no Brasil é uma das que mais utiliza o controle biológico. Atualmente, está sendo empresário algum tipo de controle biológico de praga em 4,5 milhões de hectares de cana. Na safra 2022/23, estão sendo cultivados no Brasil 8,13 milhões de hectares com cana-de-açúcar. O estado de São Paulo se destaca como o maior produtor seguido de Goiás e Minas Gerais
Existem várias insetos-praga que atacam a cana-de-açúcar. Dentre eles destacam-se as cigarrinhas de raiz-da-cana Mahanarva spp, o bicudo-da-cana Sphenophorus levis e a broca-da-cana Diatraea saccharalis. Além disso, existe o ataque de formigas cortadeiras do gênero Atta (saúvas), que também tem causado prejuízos aos canaviais.
Tanto quanto as ninfas (forma jovem) quanto os adultos das cigarrinhas-da-raiz da cana sugam a seiva da planta, sendo que o adulto, além do açúcar, injeta uma toxina nas folhas, causando um amarelecimento das folhas e ressecamento das pontas, impedindo a produtividade da cana entre 15 e 80% por hectare, dependendo da intensidade do ataque.
O bioinsumo mais utilizado para o controle de cigarrinhas-da-cana é o produzido à base do fungo Metarhizium anisopliae. Esse fungo já vem sendo utilizado no Brasil desde a década de 1970. Com o passar do tempo, novas cepas mais eficientes desse fungo foram selecionadas e produzidas em maior escala além de uma evolução na formulação de bioinsumos e nas técnicas de aplicação no campo.
A formulação mais antiga é a granulada, com o fungo desenvolvido nos grãos de arroz. Ela pode ser aplicada com o auxílio do equipamento Swatchmaster no avião agrícola. E também pode ser lavado para separação dos esporos do fungo dos grãos e ser aplicado através de pulverizações tratorizadas ou por meio de aviões agrícolas, com a adição de um espalhante adesivo. A outra formulação é do tipo pó molhável, que é composta por esporos puros e secos misturados com algum inerte para dar maior volume. Ela é misturada com água e também aplicada com o auxílio de tecnologia tratorizada ou de aviões agrícolas.
O terceiro tipo de formulação é que utiliza óleo adjuvante emulsionável. É a chamada dispersão oleosa ou até de suspensão emulsionável ou técnica. Esta formulação apresenta diversas vantagens como: maior eficiência para matar o inseto-praga visado; maior adesividade na folhagem e no corpo do inseto-praga; maior proteção dos esporos contra a radiação ultravioleta; menor evaporação da calda aplicada; maior espalhamento na folhagem e no corpo do inseto-praga, o que aumenta a área de contato com a praga; maior tempo de armazenamento em temperatura ambiente; e facilidade no transporte e na aplicação. Também é aplicado através de pulverizações tratorizadas ou de aviões agrícolas.
O bicudo-da-cana Sphenophorus levis é, atualmente, a principal praga da cana, especialmente no estado de São Paulo. Ele age da seguinte forma: após acasalamento, as fêmeas perfuram com as mandíbulas os tecidos sadios do rizoma da cana, na base das brotações, abaixo do nível do solo. Inserem os ovos individualmente a até quatro mm no interior dos colmos. Isso causa perdas de 20-30 toneladas de cana por hectare/ano e redução da longevidade do canavial. O nível de dano econômico é de no máximo 3% de tocos atacados. Canaviais com mais de 30% de tocos atacados vão para a reforma imediatamente. O bioinsumo mais utilizado para controle dessa praga é o fungo Beauveria bassiana que pode ser adquirido em diferentes formulações e aplicado com o equipamento trator chamado de cortador de soqueira ou com barras pulverizadoras com bicos hidráulicos em pingentes ao longo da linha de cana.
Uma outra praga importante na cultura da cana-de-açúcar e da broca-da-cana Diatraea saccharalis. Essa praga pode causar danos diretos e indiretos no cultivo de cana-de-açúcar. Danos diretos: causa interferência no crescimento de crescimento e perfilhos, morte das gemas, tombamento das plantas, seccionamento dos ponteiros (coração morta), formação de brotações laterais e enraização aérea. Os bioinsumos utilizados para o controle da broca-da-cana são à base de vespinhas parasitas da broca ou parasitas de ovos da mariposa de Diatraea saccharalis. A vespinha Cotesia flavipes é utilizada em mais de 4.000.000 ha de canaviais sem controle da broca-da-cana-de-açúcar, onde parasita a fase de lagarta.
O monitoramento das mariposas de Diatraea saccharalis é feito com armadilha de feromônio com fêmeas e pupas de fêmeas. As liberações da Cotesia devem iniciar 21 dias após a detecção de 10 machos em 30% das armadilhas. São três liberações espaçadas de sete dias em dose de oito tubetes/ha. Cada tubete contém 15 massas com 50 indivíduos, dando um total de 750 vespinhas por tubete, ou 6.000 vespinhas/ha.
Já a vespinha Trichogramma galloi é parasita de ovos de mariposa de Diatraea saccharalis. O monitoramento da mariposa também é realizado com armadilha de feromônio com fêmeas e pupas de fêmeas. As liberações devem ser iniciadas quando foram detectados 10 machos em 30% das armadilhas. São três liberações espaçadas de sete dias (a primeira após cinco dias da leitura da armadilha) e a dose é de 50.000 indivíduos por hectare. A liberação dessas duas vespinhas no canavial é feita atualmente por meio de drones, que fazem uma distribuição mais eficiente desse tipo de bioinsumo no campo.
Novo bioinsumo – as formigas-cortadeiras ou formigas-cultivadoras-de- fungos representam um dos grupos mais evoluídos de insetos do mundo. A vida em grandes colônias (formigueiros), onde se cultiva e se alimenta de um fungo mutualista que se desenvolve nos mais diversos substratos vegetais, confere a esses insetos polifagia, proteção e disponibilidade de alimento ou ano todo. Essas formigas ocorrem em todo o continente americano, especialmente em áreas tropicais e subtropicais, o que inclui todo o território brasileiro. Na cultura da cana-de-açúcar, um sauveiro adulto pode provocar uma perda de 3,2 toneladas de cana/ha. Em pastagens, no Cerrado 10 sauveiros de cinco anos de idade, ocupam uma área de 715 metros quadrados e consomem cerca de 21 Kg de capim por dia, o que equivale ao consumo de um boi.
Em função da importância das formigas-cortadeiras, diversos métodos de controle foram desenvolvidos, incluindo a utilização de iscas tóxicas, da termonebulização e de pós-secos. As iscas tóxicas são as mais utilizadas devido à sua praticidade onde as próprias formigas carregam substratos tóxicos para o interior do formigueiro. O principal problema do emprego de iscas químicas está relacionado à contaminação dos resíduos aplicados e que persistem no ambiente por muitos anos, contaminando lençóis freáticos e sendo assimilados por plantas cultivadas, animais e até pelo próprio homem.
Em função dessa realidade e, não tendo no mercado brasileiro qualquer isca verdadeiramente biológica para controle de formigas-cortadeiras, a Embrapa Cerrados decidiu investir em pesquisas em busca de uma alternativa biológica eficiente, para o controle de saúvas na cana-de-açúcar. O processo utilizado para desenvolver as iscas biológicas envolve uma linha de produção de massas de iscas sem formato final de utilização e uma linha de produção de esporos de fungos altamente virulentos que serão incorporados às iscas já mencionadas.
Depois de pronta, a isca é de fácil aplicação, não é tóxica ao ambiente, aos alimentos e ao ser humano e pode ser utilizada em diferentes cultivos brasileiros, tanto em orgânicos (que é um mercado em constante crescimento) como em convencionais. Podem ser usados em culturas anuais (soja, milho, algodão, feijão, trigo, hortaliças, etc), perenes (reflorestamentos, fruteiras, seringueira, etc), semiperenes (cana-de-açúcar, mandioca, etc) ou em parques . e jardins públicos ou privados sem nenhum problema.
*Roberto Teixeira Alves Engenheiro Agrônomo/Mestre e Doutor em Entomologia/Controle Biológico
Pesquisador da Embrapa Cerrados
Fonte: C ERRADOS NCO